Não sou do tipo que faz esse tipo de coisa
Ou coisa de outro tipo
Tipo coisa mau feita
Ou feita sem pensar
Não sou do tipo que revela esse tanto de coisa
Ou mesmo pouca coisa
Coisa qualquer
Ou coisa nenhuma
Não sou do tipo que arruma esse tanto de coisa
Que joga fora todas as coisas
Que guarda tantas outras
E muda de lugar coisas antigas
Não sou do tipo de causar coisa
Ou causar pouca coisa
Que cria caso com a coisa
E depois nem sabe porquê
Não sou do tipo de chamar de coisa
Coisa nenhuma
Todas as coisas
Têm um nome qualquer.
Esse blog é uma tentativa de não usar Prozac. Escrever é uma doença incurável. Mas, com certeza, uma das mais belas doenças.
Pensações
quinta-feira, 12 de junho de 2008
terça-feira, 10 de junho de 2008
Extradição
Depois que ela pediu, sem sucesso, para ser extraditada, não conseguiu pensar em coisa alguma. Duas semanas se passaram e ela permaneceu imóvel, sem notar a presença de quase nada. Nem a copa das grandes árvores que balançavam vez ou outra à sua volta a envolvia mais.
O seu único, grande e perverso medo era perder o sotaque. Por isso, foram dias de mudez. Uma grande e profunda mudez que a tornou quase imperceptível aos olhos alheios. Um silêncio que não incomodou a ninguém. E não era mesmo para incomodar. Sua única função era prender tudo que era seu, não deixar nada vazar, nada escapulir. Nem uma gota do seu particular, nem uma lágrima, nada. Nada do que era seu era para ser dado.
Vez ou outra pensava em sua pequena tragédia. Aqui, nessa terra estrangeira, não seria o melhor lugar para passar os próximos cincos anos. Não podia pensar em mais nada. Talvez devesse poupar até mesmo os pensamentos. Esses poderiam ser balbuciados durante o sono, mesmo não dormindo com frequência.
A morfina aplicada de hora certa em hora certa quase sempre era eficaz. Quando o efeito vinha lento ou pequeno, menor que sua dor, sentia vontade de gritar, mas engolia o vômito de nada, gota a gota e esperava a próxima dose, mesmo sem esperanças que ela fizesse o efeito desejado.
Sua proposta era irrevogável: ou a entregavam para pagar seus erros de um passado recente, ou nada seria dito. Manteria guardado em seu corpo flácido e amarelado todos os segredos que seus olhos já tinham visto. Manteria amarrada em cada vértebra os vícios dos amadores, as frustações dos veteranos, os esconderijos e o caminho que levava ao labirinto.
Faria como prometeu a si própria. Só manifestaria-se quando sentisse que já estava sumindo. Assim como disse ao garoto do foguete: "diga que está sumindo".
O seu único, grande e perverso medo era perder o sotaque. Por isso, foram dias de mudez. Uma grande e profunda mudez que a tornou quase imperceptível aos olhos alheios. Um silêncio que não incomodou a ninguém. E não era mesmo para incomodar. Sua única função era prender tudo que era seu, não deixar nada vazar, nada escapulir. Nem uma gota do seu particular, nem uma lágrima, nada. Nada do que era seu era para ser dado.
Vez ou outra pensava em sua pequena tragédia. Aqui, nessa terra estrangeira, não seria o melhor lugar para passar os próximos cincos anos. Não podia pensar em mais nada. Talvez devesse poupar até mesmo os pensamentos. Esses poderiam ser balbuciados durante o sono, mesmo não dormindo com frequência.
A morfina aplicada de hora certa em hora certa quase sempre era eficaz. Quando o efeito vinha lento ou pequeno, menor que sua dor, sentia vontade de gritar, mas engolia o vômito de nada, gota a gota e esperava a próxima dose, mesmo sem esperanças que ela fizesse o efeito desejado.
Sua proposta era irrevogável: ou a entregavam para pagar seus erros de um passado recente, ou nada seria dito. Manteria guardado em seu corpo flácido e amarelado todos os segredos que seus olhos já tinham visto. Manteria amarrada em cada vértebra os vícios dos amadores, as frustações dos veteranos, os esconderijos e o caminho que levava ao labirinto.
Faria como prometeu a si própria. Só manifestaria-se quando sentisse que já estava sumindo. Assim como disse ao garoto do foguete: "diga que está sumindo".
quinta-feira, 5 de junho de 2008
Eu, ela e o livro
Nas últimas semanas deixei-me seduzir por uma mulher. Confesso. Entreguei-me à ela. Entreguei-me assim como se entrega os mortos à terra, sem volta, sem nenhuma chance de retorno. Conheço-a faz tempo. A primeira vez que a vi ainda estava na faculdade, tempo de amores e confusões, amigas e confissões, desejos nada reprimidos.
Notei sua presença de longe, no entra e sai da sala de aula, entre uma e outra explicação do professor de História da Arte. Naquele tempo apenas a decorei. Nada comparado à sensação quase dramática de agora.
Depois disso veio uma música, uma música que me lembrava ela. A intérprete cantava com uma voz baixinha. Parecia que sussurrava essa canção em meus ouvidos ainda pouco experientes. Nessa hora, quando lembrava dela, mais o cantar pequeno, mais um violão calminho, sentia arrepios. A música que me lembrava ela fazia-me ver cores, todas as cores nada pastéis.
Foi uma paixão que cresceu pouco a pouco. Por vezes, ainda resistente à sua presença em minha alma, a procurava pela internet. Um contato quase que de mentira, distante. Eu sabia, naquele tempo, seria melhor assim.
Acho que ela não percebia o incômodo que me causava. Essa mulher, que hoje está na minha vida, já me causava, tempos atrás, atração. Ela não suspeitava dos poemas que escrevia pensando nela, não... ela não devia saber. Mesmo hoje com nosso contato íntimo, não tenho coragem de os mostrar a ela. Ficaria corada e no mais, estou tão extasiada por esse amor, que prefiro poupar-me de maiores emoções. As que abrigam-se em mim, agora, já são o bastante.
O mais engraçado é que ela quem me cortejou. Eu, apenas eu, apenas uma menina tentando fazer alguma coisa a mais do que o óbvio, fui cantada e laçada por ela. Seu olhar constante em minha direção, nos momentos que nos encontramos, me angustiam. Talvez por isso ela olhe tanto para mim. Um pouco má, de uma maldade que todas as mulheres deveriam ter, não perderia a oportundiade de me confundir, às vezes, debochar.
Na primeira noite que ficamos juntas, ela enroscou-me em seu xale. A cada trama do tecido, descobria-me mais ela que eu. Seu perfume não era agradável. Nem o dela, nem o do xale. Mas isso foi o que menos me importou naquele momento. De uma coragem primogênita, ela me falou de suas tristezas e amarguras e de como fazia para que suas tragédias não fossem a única assinatura de sua vida.
Curiosamente, trouxe-me um espelho de presente. Nesta noite, dormimos, as duas, exaustas de tanto nos amar. Nos amamos sob o olhar fotográfico deste espelho que a fez, tantas vezes, e quantas mais poderiam ser, três. Ela, o espelho e a tela.
Ela nunca mentiu para mim. Sempre diz que terá que ir embora. E eu sei que ela irá. Imagino eu, logo, neste final de semana que se aproxima. "Outras pessoas me esperam", sempre diz com o cigarro pendurado no canto da boca. Ontem deu-me uma de suas saias. Para mim, isso foi um sinal de despedida. E de amor também. Era a saia mais rodada, também a mais colorida. Não imagino quantos já a levantaram em seu corpo esguio e desforme. Nem quero imaginar. Não faz diferença. Não a usarei para ela, correria o risco de virar imortal através de suas mãos cheias de anéis, embora pudesse ela, também, enfiar-me-as por debaixo dos panos e fazer-me sentir coisas para as quais ainda não me preparei, arrancar segredos que eu ainda não posso contar. Só depois que devolvê-lo, no final de semana que se aproxima, o livro de capa colorida intitulado Frida Kahlo, vestirei a saia que ganhei e usarei-a para sempre, em cada composição, em toda poesia e nos quadros que ainda vou emoldurar pela vida. .
Notei sua presença de longe, no entra e sai da sala de aula, entre uma e outra explicação do professor de História da Arte. Naquele tempo apenas a decorei. Nada comparado à sensação quase dramática de agora.
Depois disso veio uma música, uma música que me lembrava ela. A intérprete cantava com uma voz baixinha. Parecia que sussurrava essa canção em meus ouvidos ainda pouco experientes. Nessa hora, quando lembrava dela, mais o cantar pequeno, mais um violão calminho, sentia arrepios. A música que me lembrava ela fazia-me ver cores, todas as cores nada pastéis.
Foi uma paixão que cresceu pouco a pouco. Por vezes, ainda resistente à sua presença em minha alma, a procurava pela internet. Um contato quase que de mentira, distante. Eu sabia, naquele tempo, seria melhor assim.
Acho que ela não percebia o incômodo que me causava. Essa mulher, que hoje está na minha vida, já me causava, tempos atrás, atração. Ela não suspeitava dos poemas que escrevia pensando nela, não... ela não devia saber. Mesmo hoje com nosso contato íntimo, não tenho coragem de os mostrar a ela. Ficaria corada e no mais, estou tão extasiada por esse amor, que prefiro poupar-me de maiores emoções. As que abrigam-se em mim, agora, já são o bastante.
O mais engraçado é que ela quem me cortejou. Eu, apenas eu, apenas uma menina tentando fazer alguma coisa a mais do que o óbvio, fui cantada e laçada por ela. Seu olhar constante em minha direção, nos momentos que nos encontramos, me angustiam. Talvez por isso ela olhe tanto para mim. Um pouco má, de uma maldade que todas as mulheres deveriam ter, não perderia a oportundiade de me confundir, às vezes, debochar.
Na primeira noite que ficamos juntas, ela enroscou-me em seu xale. A cada trama do tecido, descobria-me mais ela que eu. Seu perfume não era agradável. Nem o dela, nem o do xale. Mas isso foi o que menos me importou naquele momento. De uma coragem primogênita, ela me falou de suas tristezas e amarguras e de como fazia para que suas tragédias não fossem a única assinatura de sua vida.
Curiosamente, trouxe-me um espelho de presente. Nesta noite, dormimos, as duas, exaustas de tanto nos amar. Nos amamos sob o olhar fotográfico deste espelho que a fez, tantas vezes, e quantas mais poderiam ser, três. Ela, o espelho e a tela.
Ela nunca mentiu para mim. Sempre diz que terá que ir embora. E eu sei que ela irá. Imagino eu, logo, neste final de semana que se aproxima. "Outras pessoas me esperam", sempre diz com o cigarro pendurado no canto da boca. Ontem deu-me uma de suas saias. Para mim, isso foi um sinal de despedida. E de amor também. Era a saia mais rodada, também a mais colorida. Não imagino quantos já a levantaram em seu corpo esguio e desforme. Nem quero imaginar. Não faz diferença. Não a usarei para ela, correria o risco de virar imortal através de suas mãos cheias de anéis, embora pudesse ela, também, enfiar-me-as por debaixo dos panos e fazer-me sentir coisas para as quais ainda não me preparei, arrancar segredos que eu ainda não posso contar. Só depois que devolvê-lo, no final de semana que se aproxima, o livro de capa colorida intitulado Frida Kahlo, vestirei a saia que ganhei e usarei-a para sempre, em cada composição, em toda poesia e nos quadros que ainda vou emoldurar pela vida. .
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