Depois que ela pediu, sem sucesso, para ser extraditada, não conseguiu pensar em coisa alguma. Duas semanas se passaram e ela permaneceu imóvel, sem notar a presença de quase nada. Nem a copa das grandes árvores que balançavam vez ou outra à sua volta a envolvia mais.
O seu único, grande e perverso medo era perder o sotaque. Por isso, foram dias de mudez. Uma grande e profunda mudez que a tornou quase imperceptível aos olhos alheios. Um silêncio que não incomodou a ninguém. E não era mesmo para incomodar. Sua única função era prender tudo que era seu, não deixar nada vazar, nada escapulir. Nem uma gota do seu particular, nem uma lágrima, nada. Nada do que era seu era para ser dado.
Vez ou outra pensava em sua pequena tragédia. Aqui, nessa terra estrangeira, não seria o melhor lugar para passar os próximos cincos anos. Não podia pensar em mais nada. Talvez devesse poupar até mesmo os pensamentos. Esses poderiam ser balbuciados durante o sono, mesmo não dormindo com frequência.
A morfina aplicada de hora certa em hora certa quase sempre era eficaz. Quando o efeito vinha lento ou pequeno, menor que sua dor, sentia vontade de gritar, mas engolia o vômito de nada, gota a gota e esperava a próxima dose, mesmo sem esperanças que ela fizesse o efeito desejado.
Sua proposta era irrevogável: ou a entregavam para pagar seus erros de um passado recente, ou nada seria dito. Manteria guardado em seu corpo flácido e amarelado todos os segredos que seus olhos já tinham visto. Manteria amarrada em cada vértebra os vícios dos amadores, as frustações dos veteranos, os esconderijos e o caminho que levava ao labirinto.
Faria como prometeu a si própria. Só manifestaria-se quando sentisse que já estava sumindo. Assim como disse ao garoto do foguete: "diga que está sumindo".
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